sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Um pequeno conto kierkegaardiano

Pra quem gosta de pequenas histórias comparativas, em especial com temáticas cristãs, essa é uma boa... Tirei do livro "O desespero humano", do dinamarquês Sören Kierkegaard:

"Imaginemos um pobre jornaleiro e o imperador mais poderoso do mundo, e que este potentado tivesse bruscamente o capricho de o mandar chamar, a ele que jamais tinha sonhado coisa semelhante, e 'cujo coração jamais tinha ousado conceber' que o imperador soubesse da sua existencia, a ele que teria como felicidade sem nome a sorte de, uma vez que fosse, ver o imperador, e que o teria contado aos filhos e aos netos como o acontecimento capital da sua vida - se o imperador o mandasse chamar, e lhe fizesse saber que o queria para genro: que o sucederia? Então o jornaleiroo todos os homens, sentir-se-ia um pouco ou muito embaraçado, confuso, constrangido. O caso havia de lhe parecer (e é o lado humano) humanamente bem estranho, insensato, e não ousaria contar nada a quem quer que fosse, estando já tentado, de si para consigo, por esta explicação, da qual nenhum dos seus vizinhos tardaria em fazer-se eco. O imperador queria rir-se à sua custa, toda a cidade o troçaria, os jornais publicariam sua caricatura e as comadres venderiam uma canção sobre o noivado com a filha do príncipe. Porém, tornar-se genro do imperador não seria contudo uma realidade iminente, visível? O jornaleiro, dessa forma, poderia verificar por todos os seus sentidos até que ponto era sério o convite do imperador. Ver se não pensava senão em troçar do pobre diabo, em torná-lo infeliz para o restante dos seus dias - e ajudá- a acabar num hospital de doidos. Porque há no caso um quind nimis, que bem facilmente se pode transformar no seu contrário. Um pequeno testemunho devor, isso o jornaleiro compreendia-o, e a cidade achá-lo-ia plausível, e todo o respeitável público bem-educado, e todas as venderodas de canções, em resumo acinco vezes cem mil almas desse grande burgo, sem dúvida uma grande cidade pelo número de seus habitantes, mas uma cidadezinha para efeito de compreender e apreciar o extraordinário - mas esta coisa, desposar a filha do imperador, sempre é um exagero. Suponhamos agora uma realidade, não exterior mas interior, e portanto sem nada de material que pudesse dar ao jornaleiro qualquer certeza, mas sia fé por si só, e da qual tudo dependesse, teria ele a suficiente e humilde coragem para ousar acreditar nela - uma coragem sem humildade não ajuda nunc, com efeito, a 'crer'. Essa coragem, quantos jornaleiros a teriam? Mas aquele que não a tivesse, escandalizar-se-ia. Essa coisa extraordinária far-lhe-ia quase o efeito duma zombaria pessoal. Talvez confessasse então ingenuamente: 'São coisas demasiado altas para mim e que não me podem entrar na cabeça. Para falar sem rodeios, isso parece-me loucura".
E o cristianismo então! A lição que ele dá é que esse indivíduo, como qualquer indivíduo, seja ele qual for, marido, mulher, criada, ministro, negociante, barbeiro etc., é que esse indivíduo existe 'perante Deus' - esse indivíduo que porventura se orgulharia de ter uma vez em toda a sua vida falado ao rei, esse mesmo homem, que seria já alguém pelo seu comércio amistoso com este ou aquele, esse homem frente a Deus, pode falar com Deus quando quiser, com a certeza de ser escutado, e é a ele que propõem viver na intimidade de Deus! Se não bastasse: foi por esse homem, por ele também que Deus veio aoundo, se deixou encarnar, sofreu e morreu. É esse Deus de sofrimento que lhe roga e quase suplica que aceite o socorro, que é um oferecimento! Em verdade, se há no mundo coisa para enlouquecer, não será esta? Quem quer que não o ousa crer, por falta de humilde coragem, escandaliza-se. Em se escandalizando, é porque a coisa é demasiado elevada para ele, porque não lhe pode entrar na cabeça, porque não pode neste caso falar com toda a franqueza, e eis porque lhe é necessário pô-la de lado, considerá-la vaa, uma loucura, uma ingenuidade, de tal modo ele se sente sufocado."
"Por estarmos unidos com Cristo, por meio da nossa fé nele, nós temos a coragem de nos apresentarmos na presença de Deus com toda a confiança." (Efésios 3:12)
 
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